A jornalista Valéria Baracat Gyy se preparava em 2004 para cobrir as Olimpíadas em Atenas, na Grécia, quando recebeu o diagnóstico de câncer de mama. Quase uma década depois, ela está em pleno tratamento de uma recidiva (após o término do tratamento inicial, o câncer voltou), algo que não a impede como jornalista em sua missão de ajudar na conscientização da sociedade por meio de palestras, de campanhas e do Instituto Arte de Viver Bem, por ela presidido. Seu ato mais recente foi a inauguração da Casa da Mulher, em São Paulo, que oferece orientação jurídica, emocional e nutricional para pacientes em tratamento de câncer de mama e seus familiares, tendo o suporte de uma equipe multidisciplinar. Estes e outros assuntos são abordados nesta entrevista concedida com exclusividade ao blog jornalismOncologia.

jornalismOncologia – Você já tinha uma carreira no jornalismo consolidada ao receber o diagnóstico e, nesta profissão, o êxito está associado, muitas vezes, a uma rotina bastante agitada. Como você se encontrava física e mentalmente antes do diagnóstico e o quanto saber da doença impactou sua vida?
Valéria Baracat Gyy – Antes do diagnóstico, eu estava muito bem física e emocionalmente. Praticava atividades físicas e me preparava para cobrir as Olimpíadas da Grécia, como jornalista, quando soube o diagnóstico. Minha rotina mudou muito. Tive que devolver a passagem, fiz o descredenciamento, se foi o sonho de fazer um bom trabalho e parti para o tratamento. O câncer de mama, assim como outros tipos, muda completamente a nossa vida. Da noite para o dia, tudo vira de ponta cabeça. Entram na nossa vida, sem pedir licença, um nódulo maligno e uma equipe multidisciplinar. Ou seja, entrou um mundo estranho e desconhecido, que eu tinha que desvendar. Foi o que eu fiz. Além de tudo isso, eu precisava manter o bom humor e a autoestima lá em cima.
Você é uma das mulheres mais engajadas deste país no que se refere à conscientização sobre o câncer de mama. Esta sua determinação existe desde o momento do diagnóstico ou é um ímpeto que foi nascendo ao longo do tratamento?
Desde o momento do diagnóstico, em 2004, eu passei a estudar a doença. Eu queria saber o que o ocorria no meu próprio corpo. Então, continuei com estudos e palestras sobre conscientização, dando apoio às mulheres em tratamento. Começamos com as atividades do Instituto Arte de Viver Bem (IAVB) somente em 2009.
Qual foi sua maior motivação ao criar o Instituto Arte de Viver Bem e como esta ONG evoluiu ao longo dos anos?
Minha motivação foi a falta de informação confiável. Eu não as achava na internet e, por isso, resolvi publicar as cartilhas, em parceria com a Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo e, mais recentemente, com a Editora Abril. A ONG evoluiu com trabalho árduo para fazer grandes campanhas publicitárias, em parceria com a agência VML, do grupo Newcomm, que criou a campanha das bolas de vários esportes, fazendo alusão às mamas. Tivemos adesão de vários atletas, como Emerson Fittipaldi, Hortência Marccari, Giba, Tony Kanaan, Anderson Varejão, Marta, Vitor Belfort, Ronaldinho Gaúcho e Cesar Cielo. Já, em 2013, convocamos o Neymar, que tem levado a mensagem de prevenção por todo o país e até para os Estados Unidos. A parceria da PR Newswire ajudou muito, uma vez que nos cederam o painel da Times Square, em Nova York. Com grandes parceiros e muitas matérias veiculadas nos principais veículos de comunicação do Brasil, conseguimos levar muita informação para quem tanto precisa.

O reconhecimento ao trabalho que é realizado pelo Instituto fez de você uma fonte de referência para a mídia, tanto para relatar sua trajetória como paciente como também para divulgar as inúmeras campanhas que são voltadas à prevenção e diagnóstico precoce. Você descreveria a reportagem que mais marcou sua vida até hoje?
Não tenho uma de preferência, já que todas são importantes, mas a primeira entrevista que eu dei, quando minha foto foi estampada na primeira página do jornal Folha de São Paulo, em um domingo, foi impactante. Eu relatei a sensação de vitória fazendo analogia a um atleta, que sobe no pódio, para receber uma medalha de ouro. Todos os lugares que eu entrava, restaurantes, shoppings, as pessoas me aplaudiam por ser um exemplo de superação, de que podemos vencer a doença. Foi nesse momento que eu percebi que poderia ser útil à sociedade, passando informações confiáveis. A própria Hebe Camargo, neste dia, quando eu entrei no restaurante que ela estava, se levantou e me aplaudiu. Ali, ela me disse que eu tinha uma missão, que tenho tentado cumprir.
Quais são os temas relacionados ao câncer de mama que você acredita que devem sempre estar sempre presentes na agenda jornalística? Por quê?
Prevenção sempre, já que o diagnóstico precoce leva à cura. Pouco é abordado sobre a mulher que está em tratamento, as dificuldades pelas quais elas passam, os direitos que possuem, os exercícios que precisam fazer. Passamos por muitos momentos difíceis, inclusive, discriminação no mercado de trabalho, mas a imprensa não aborda. As mulheres em tratamento são relegadas ao segundo plano.
Muitos dos temas mais relevantes você já abordou em inúmeras campanhas. Conte como foi concebida a campanha atual, estrelada pelo craque do Barcelona e da seleção brasileira de futebol, Neymar?
Precisávamos dar continuidade à campanha, que foi muito ousada e de grande repercussão, em 2011, tanto no Brasil quanto nos EUA. Nada melhor do que convocar o melhor jogador de futebol brasileiro da atualidade para levarmos essa mensagem. O pai do Neymar Jr, o Seu Neymar, foi extremamente sensível à causa e topou na hora.

Há uma lista extensa de personalidades que já estiveram à frente de campanhas realizadas pelo Arte de Viver Bem. Qual é a sua sensação ao ver sempre o trabalho da ONG sendo respaldado por formadores de opinião?
A sensação é de felicidade ao saber que muitos brasileiros começaram a despertar para a importância de usar suas imagens para causas sociais, que são realmente relevantes para a melhoria da qualidade de vida do cidadão. Muitas personalidades, tais como a Hebe e Emerson Fittipaldi, já possuíam essa consciência, e serviram de exemplo para tantos outros. A credibilidade, aliada à seriedade do nosso trabalho, fizeram com que personalidades e pessoas desconhecidas abraçassem a nossa campanha.
Quais critérios você usa para avaliar se determinada personalidade está realmente engajada em uma ação com o foco na prevenção e no combate ao câncer e não está interessado em uma autopromoção?
O motivo pelo qual a pessoa entrou na campanha não é relevante. O que vale é o engajamento dela, seja para autopromoção ou porque realmente a causa é importante.
Recentemente, a editora Abril distribuiu a cartilha de conscientização sobre o câncer de mama do Instituto para os assinantes das revistas Contigo, Women´s Health, Ana Maria, Boa Forma, Cláudia, dentre outros títulos da casa. Qual foi o impacto gerado por esta parceria? Quais outras parcerias com a mídia se mostraram exitosas?
O impacto foi enorme. A nossa cartilha foi encartada em mais de dois milhões de exemplares das revistas publicadas pela Editora Abril por decisão do Dr. Roberto Civita, que aprovou bem antes da sua morte. O impacto quando você passa informação confiável é sempre muito grande, neste caso especifico, junto às leitoras das revistas femininas da editora. Outras parcerias, tais como com a agência de publicidade VML, PR Newswire e Secretaria da Saúde são de extrema importância para que a gente leve a informação confiável. O IAVB acabou assumindo o papel do Governo Federal, fazendo grandes campanhas de prevenção.
A Casa da Mulher, inaugurada recentemente pelo Instituto, foi criada com qual objetivo?
Com objetivo de dar apoio às mulheres com câncer de mama e seus familiares, uma vez que não existia em São Paulo um centro de apoio a elas, como tem para criança, adolescentes e idosos. A casa dá orientação jurídica, emocional e nutricional, ajuda no resgate da autoestima, enfim, temos uma equipe multidisciplinar que dá suporte a essas mulheres e seus familiares.
É possível que a Casa da Mulher seja, futuramente, vista como um divisor de águas na história do Instituto Arte de Viver Bem?
Sim, com certeza. Na Casa da Mulher, vamos poder dar mais assistência a quem está em tratamento do câncer de mama e também aos seus familiares, que não sabem, muitas vezes, como tratar uma pessoa tão querida e com essa patologia.
Qual é a mensagem que você gostaria de passar para as mulheres que, assim como você, estão hoje em tratamento? E para os jornalistas que desejem trabalhar na área de saúde, qual é seu o recado?
Como paciente, fazer o tratamento com seriedade e respeito ao nosso momento. Fazer todo controle rigorosamente em dia, além de cuidar da alimentação, praticar atividade física que ajudam na recuperação. E, para os jornalistas, como jornalista que sou, procurar mais pautas no que se referem às mulheres em tratamento, pela razão que muitos assuntos não são abordados, a não ser superação. Toda hora vemos matérias de superação, mas para alcançá-la as mulheres passam por um longo e doloroso processo, que quase ninguém da mídia dá atenção. Daí dão destaque quando alguém famoso, como a Angelina Jolie, vem a público contar algo pelo qual passou. Só que a realidade dos famosos é outra, completamente diferente, da mulher que é tratada pelo SUS. Estes problemas são os que eu gostaria que fossem resolvidos com a ajuda da mídia.
Gostaria de participar da ONG estou em tratamento e Graças a Deus estou bem obrigado bjos
Olá Elisabete, você pode apoiá-los a partir de cadastro no site http://vencerocancer.com.br/apoie/