O câncer é uma doença plural e complexa. São diferentes capacidades biológicas, ou seja, cada tumor pode ser desenvolvido a partir de vias e mecanismos específicos. Da mesma forma, não há uma receita mágica e sim tratamentos individualizados com maior ou menor taxa de resposta. A mídia, principalmente a não especializada em saúde e ciência, demonstrou um imenso despreparo ao se deparar com a pauta acerca da cápsula que traz o composto fosfoetanolamina sintética, denominada pelos meios de comunicação como a “pílula do câncer”. O tema está presente na agenda setting desde agosto de 2015 e tem gerado um grande impacto social, envolvendo os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com ampla repercussão internacional e muita desinformação para o público-leigo.
A polêmica em torno da pílula do câncer começou quando o químico, livre-docente e aposentando pela USP, Gilberto Chierice, concedeu uma entrevista para a emissora EPTV, filial da Rede Globo na região de São Carlos e Araraquara, no interior de São Paulo, na qual foi dada ênfase para a fosfoetanolamina sintética como sendo uma substância que, nas palavras do pesquisador, imita uma substância presente no organismo e sinaliza células cancerosas para a remoção pelo sistema imunológico. A matéria, reproduzida no Portal G1 com um título que enfatiza uma fala do cientista ‘Pesquisador acredita que substância desenvolvida na USP cura o câncer”, ressalta que o composto, sintetizado pelo grupo desde o fim dos anos 1980, não tinha sido comercializada até então apenas pela má vontade das autoridades. A fosfoetanolamina sintética, no entanto, até aquele momento, nunca tinha sido submetida a qualquer tipo de teste de eficácia, nem de segurança em humanos. Em consequência da reportagem, intensificou-se o desejo de pacientes de exigir a distribuição, pela via judicial, da pílula milagrosa.Após a ampla repercussão do assunto que, a partir publicação da reportagem do G1 foi inserido na agenda setting da mídia brasileira, o mesmo veículo trouxe, duas semanas depois, uma reportagem cujo discurso buscava contrapor o texto anterior, desta vez cumprindo o papel de ouvir opiniões díspares e contextualizando a importância da pesquisa clínica por meio do detalhamento do passo a passo de cada etapa que envolve o desenvolvimento de uma nova droga. No entanto, o alarde já estava feito e o assunto, quase um ano depois, não saiu do noticiário nacional e repercute, como abordaremos neste artigo, também na mídia convencional e em revistas científicas internacionais.Parte dos comentários acima são de artigo que publiquei essa semana na revista Communicare, da Faculdade Cásper Líbero. Clique aqui para ler na íntegra.